Franciel Cruz: Jabá e homossexualidade‏

Há coisa de 10 anos, mais exatamente em julho de 2004, a Revista
Placar publicou uma reportagem intitulada “Nas ondas (poluídas) da
rádio”. Na matéria, assinada por Manuela Martinez, havia a denúncia de
que os dois principais times do estado, Bahia e Vitória, bancavam do
próprio bolso cinco equipes de rádio de Salvador.

A repórter informava que o Esporte Clube Vitória, único representante
na Série A daquele ano, gastava 4% de todo o seu orçamento, cerca de R$
500 mil reais, com as referidas emissoras. Questionado sobre o
problema, o então presidente do Clube, Paulo Carneiro, fez a seguinte
confissão. “Este ano quisemos moralizar o processo e passamos a exigir
também a contrapartida (…) Veiculamos a nossa campanha institucional nas
rádios. Em troca eles recebem uma ajuda de custo para passagem e
hospedagem dos jogos do Vitória fora de salvador”.

Passou-se uma década e o atual presidente do Esporte Clube Vitória, Carlos Falcão, em entrevista
publicada nesta terça-feira, dia 11, no Globo Esporte, disse que “O
Vitória não tem o que divulgar, porque o Vitória não paga (jabá). Nós
temos uma relação muito transparente. O Vitória tem um conselho fiscal
atuante, uma auditoria interna e externa… O Vitória não tem nada a
esconder”. 

Porém, mesmo não tendo nada a esconder, o presidente do Vitória não
falou sobre os tais contratos relatados por Paulo Carneiro que, segundo a
repórter da Placar, foi assinado “para tentar dar ares de transparência
ao negócio”. O irônico da história é que, em 2004, não há nenhuma
aspas na reportagem da Revista Placar para o então presidente do Bahia,
que na ocasião era comandado exatamente por Marcelo Guimarães, pai do
último ex-presidente do Clube, Marcelo Guimarães Filho.

Porém, se a direção tricolor da época se calou, a atual resolveu
botar o dedo na ferida. No dia 11 de fevereiro, o assessor especial da
presidência, o marqueteiro Sidônio Palmeira, garantiu em entrevista a
uma rádio local que “algumas pessoas da crônica recebiam dinheiro para
falar bem do clube e cortamos todos. Essa diretoria acabou com o jabá”.
E mais. No dia seguinte, em sua página do Facebook, a direção do Clube
não só apoiou as declarações do assessor especial, como deu um passo
adiante, informando que o material seria “apresentado na próxima reunião
do Conselho Deliberativo para apreciação e o encaminhamento
necessário”. 

Houve um constrangedor silêncio de tradicionais entidades de classe,
como Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e o Sindicato dos Jornalistas
(Sinjorba). Apenas a Associação Baiana de Cronista Desportiva lançou uma
nota pública estrilando. 

No entanto, na reunião do dia 22 de fevereiro do Conselho Deliberativo, véspera do clássico Ba x Vi, a direção do Bahia descumpriu
a promessa, alegando que não tinha sido possível recolher “possível
recolher todos os documentos necessários”. Contudo, diante do barulho
feito por sócios, conselheiros e torcedores em geral, não havia mais
como recuar. 

Assim, na noite de segunda-feira, dia 10, houve nova reunião do
Conselho Deliberativo do Bahia, com a promessa de entrega no dia
seguinte da lista com as “relações econômicas do Esporte Clube Bahia”.
Lista é modo de dizer. Foi disponibilizado um calhamaço com cerca de 500 páginas,
com as mais variadas situações. Na papelada existiam desde dinheiro
para radialistas, benefícios para parentes e até gastos exorbitantes em
churrascarias de Salvador, que chegaram a cinco dígitos.

Novamente, silêncio constrangedor das tradicionais entidades de
classe, ABI e Sinjorba. Mais uma vez, só quem se pronunciou foi a ABCD.
O problema é que o atual presidente da entidade é sócio da Sportgol
Assessoria e MKT, empresa citada na lista como tendo recebido a maior
quantia nos últimos três anos, cerca de R$ 250 mil

Quem tem feito um barulho bom é a torcida do Bahia, que de modo justo
está indignada com os desmandos da gestão anterior. O problema é que na
imprensa, nas ruas e até mesmo em uma parte da torcida tricolor, o destaque
tem sido para as passagens e hospedagem da apresentadora da Rede
Record, Jéssica Senra, nos hotéis Transamérica Prestige Beach Class
Internacional, em Recife, e JW Marriott Hotel, no Rio de Janeiro,
juntamente com o então presidente do Bahia. 

Lamentavelmente, invés de se preocupar com coisas sérias, como diria
Caetano Veloso, “todo mundo quer saber com quem você se deita. Nada pode
prosperar”. Ato contínuo, a apresentadora afirmou, não sem razão, que
“as minhas questões particulares dizem respeito a mim”. Fato. Deve
existir a presunção da inocência de Jéssica. Afinal, nem ela nem ninguém
têm a obrigação de exigir de algum amigo, parente, colega, amante ou o
diabo, que lhe informe a priori de onde vem o dinheiro que paga uma
estadia num hotel ou uma passagem. É fato, porém, que há um gosto de
sangue no ar. Revoltada, a torcida do Bahia, que viu seu clube perder
jogadores até por falta de pagamento no FGTS, não se conforma que se
gaste o dinheiro do Clube desta forma. E Jéssica deveria ter humildade
de compreender isto – e não ficar debochando por aí, afirmando bobagens
do tipo que quem quiser saber “me pague uma cerveja e a gente conversa”

Assunto encerrado.

Assunto encerrado, vírgula. O ex-presidente Marcelo Guimarães Filho,
que foi deposto pela justiça e está no centro do furacão, à guisa de
defesa, afirmou em entrevista publicada nesta quarta-feira, dia 12, no
Correio*, que o atual presidente “Fernando Schmidt precisa assumir que é
homossexual”. 

Oxente. Como assim, precisa assumir? O que tem a ver homossexualidade
com o pagamento de jabás e outras relações escusas envolvendo o Bahia?

Pois bem digo, pois mal, estas infames tergiversações estão dominando
o debate. Para se ter uma ideia, além de ter sido destaque no site
Bahia Notícias, o de maior audiência do estado, estes dois casos também
estão entre as cinco notícias mais lidas no correio 24h, veículo online
do Correio*, jornal mais vendido da Bahia. Outro dado a se destacar é
que o site Bocão News, de propriedade do sócio do presidente da ABCD,
silenciou nos momentos iniciais das denúncias, mas nas últimas horas já
publicou diversas matérias sobre nefastas e homofóbicas afirmações de
Marcelo Guimarães Filho. (Alô, tergiversação!)

Está claro, portanto, que alguns querem transformar o que seria uma busca aos ratões em um triste Programa de Ratinho.

É preciso e urgente, neste momento, que os sócios, conselheiros e
torcedores em geral puxem o freio de mão nesta chibança e mudem este
tenebroso roteiro, retirando o debate da alcova e levando-o para o onde
realmente interessa: a transparência nas contas dos clubes. 

Franciel Cruz

Autor(a)

Dalmo Carrera

Fundador e administrador do Futebol Bahiano. Contato: dalmocarrera@live.com

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